A queda do liberalismo no entre guerras
Uma análise sobre o século
XIX comprova com relativa facilidade que ele esteve dominado pelo mundo
burguês. Como nunca antes, o ocidente passou por uma série de revoluções
técnicas e cientificas que possibilitaram o surgimento de um modo de vida
completamente novo, onde a cidade tornou-se o centro dinâmico, local das
novidades centradas sobre a fábrica e o mundo do trabalho que a envolvia. O
progresso parecia não ter fim, isso levou a um otimismo que teve efeito nas
correntes de pensamento filosófico e nas artes. Os Estados autocráticos estavam
em franca extinção enquanto a onda constitucional tomava todos os Estados
soberanos. A base dessas mudanças era o mundo liberal, visto aqui como conjunto
de ideias políticas, econômicas e sociais, baseadas na defesa da “liberdade”
individual frente ao poder estatal. Tal sistema era sentido em todos os campos
da vida, como a religião, a produção intelectual e a produção material que se
assentava na propriedade privada dos meios de produção. Essa criação burguesa
ameaçava destituir todos os antigos poderes, criando um mundo completamente
novo. Esse processo ainda ocorria no início do século XX, quando tem início a
primeira guerra mundial. (HOBSBAWM, 1995).
O único “perigo” que
parecia eminente para essa sociedade liberal vinha das massas descontentes, vistas
pela burguesia como a camada ignorante da população que tinha como único
compromisso a destruição da ordem social. Em seu seio nasciam correntes de
pensamento que estimulavam a ação encabeçada por um movimento revolucionário,
que faria com que os trabalhadores tomassem o poder derrubando e destruindo a
burguesia. A ameaça vermelha horrorizava os estados liberais do Ocidente, sua
existência era uma contradição a tudo que o mundo burguês criou. As revoluções
de 1848 e a Comuna de Paris de 1871 deram uma lição à burguesia mundial e a
todos os governos liberais: Era preciso conter as massas. Como resposta surgiram às instituições
democráticas liberais, sua base ideológica era a possibilidade de
representatividade que a população (ou parte dela) teria, ao votar diretamente
em assembleias representativas, ministros ou presidentes. O surto democrático
tomou conta da Europa, quadro que se estendeu até chegada da primeira guerra
mundial, “Com exceção da Rússia
Soviética, todos os regimes que emergiam da primeira guerra mundial, novos ou
velhos, eram basicamente regimes parlamentares representativos eleitos, mesmo a
Turquia” (Eric Hobsbawm, 1995, página
114). Mas isso estava prestes a
mudar.
A tendência política e
econômica no mundo começou a mudar para outra direção. Tal ação não foi
liderada pelas esquerdas revolucionárias, mas encabeçada pela poder que emanava
da extrema direita, hostil às instituições liberais e ao perigo da revolução
social, que tinha de ser contido com uma base autoritária centralizada na figura
de um líder reconhecido pelo povo. A base ideológica desses partidos era o amor
incondicional a nação, que deveria ser defendida das ameaças externas e internas,
como ficaria evidente nas constantes perseguições de comunistas e judeus.
“As condições ideais para o triunfo da extrema direita
alucinada eram um estado Velho, com seus mecanismos dirigentes não mais
funcionando; uma massa de cidadãos desencantados, desorientados e descontentes,
não mais sabendo a quem ser leais; fortes movimentos socialistas ameaçando ou
aparecendo ameaçar com a revolução social, mas não de fato em posição de
realizá-la; e uma inclinação do ressentimento nacionalista contra os tratados
de paz de 1918-20... A novidade do fascismo era que, uma vez no poder, ele se
recusava a jogar segundo as regras do velho jogo político, e tomava posse
completamente onde podia... não havia mais limites políticos para o que se
tornava, caracteristicamente, a desenfreada ditadura de um supremo “líder”
populista.” (Eric Hobsbawm, 1995, página
130).
Para
o historiador Eric Hobsbawm a primeira guerra mundial e a crise econômica de
1929 foram os acontecimentos responsáveis pelo desmantelamento das estruturas
liberais no ocidente. Eles causaram um enorme prejuízo aos países do ocidente, levando a um
forte descontentamento popular sobre o modelo liberal, que os dizimava em
detrimento do grande capital. A insatisfação popular se evidencia no aumento do
antissemitismo, uma vez que os judeus eram vistos como os representantes do
patronado e da grande empresa. Os regimes da extrema direita vão se alimentar
desse rancor social, oferecendo um aparato ideológico que garanta ao povo um
lugar no cenário nacional. Tais discursos se direcionam as classes
trabalhadoras, que serão o principal alicerce desses movimentos de extrema
direita. Estes governos partem do antissemitismo pré-totalitário para alimentar
a ideia de que os judeus tinham um plano para a conquista política e econômica
do mundo, em vista de dominar os países frágeis para escravizar seu povo. A
hipócrita “solução” que o governo nazista soube tão bem empregar era de que a
população devia se unir a causa nacional, todos tinham a responsabilidade de
combater o mal que ameaçava a pureza dos povos superiores. Não houve limites
morais para que tais regimes pudessem controlar seu povo, todas as cartas que
estivessem à disposição seriam jogadas. (ARENDT, 1989).
A vitória politica de tais
movimentos extremados teve início na Itália, com a vitória de Mussolini em sua
marcha sobre Roma, tal política foi seguida mais tarde na Alemanha com a
chegada de Hitler ao poder. Para Hobsbawm a vitória do fascismo na Alemanha foi
o início de um movimento que se internacionalizaria, alcançando os quatro
cantos do globo.
“Sem
o triunfo de Hitler na Alemanha em 1933, o fascismo não teria se tornado um movimento
geral... sem o triunfo de Hitler na Alemanha, a idéia do fascismo como um
movimento universal, uma espécie de equivalente direitista do comunismo
internacional tendo Berlim como sua Moscou, não teria se desenvolvido.”. (HOBSBWM, 1995, página 120).
Apesar de não ser um
movimento homogêneo o fascismo compartilhava ideias comuns
como o anticomunismo, antiliberalismo e o nacionalismo, este ultimo foi a base
do racismo extremado. O amor ao nacional era também o ódio a tudo que fosse
diferente, este elemento esteve aparentemente ausente no fascismo Italiano, mas
na Alemanha vai ser o combustível essencial do regime. A direita fascista se aproveitou dos
problemas estruturais vividos no mundo liberal. Seu temor à revolução social fez
com que se aproximassem das massas, que serão mobilizadas em uma escala sem
precedentes. Há uma inversão das ferramentas revolucionárias da esquerda
comunista no sentido de construção de uma base social que legitimasse o governo
autoritário. As extremas direitas irão se utilizar de conceitos científicos
para construir com seu povo os ideais de grande nação, superior as demais pela pureza
de sua raça. Vão criar uma tradição histórica completamente mítica, cujo objetivo
era de sustentar o discurso nacional.
No
poder tais governos tiveram o feito de combater a grande depressão iniciada em
1929. Trouxeram as bases econômicas para o centro do Estado, passando a controlar
a sociedade civil e o grande capital. Expurgaram completamente a velha ordem
social, ao mesmo tempo em que representaram os interesses das classes dominantes
nacionais. Sua vitória como forma ideal de sistema politico e econômico parecia
certa em todo mundo, o liberalismo parecia entrar em ruínas e deixar de existir, pelo menos até o inicio da segunda grande guerra, que se
mostraria a mais devastadora da história, onde o nacionalismo da extrema
direita seria testado aos seus limites mais inimagináveis.
Bibliografia
ARENDT, Hannah. Origens do Totalitarismo. São Paulo: Companhia das Letras, sétima
reimpressão, tradução Roberto Raposo, 1989.
HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: O breve século XX 1914-1991. São Paulo: Companhia
das Letras, tradução Marcos Santarrita, segunda edição, 1995.
MAZOWER, Mark. Continente
Sombrio: A Europa no século XX. São Paulo: Companhia das Letras, tradução
Hildegard Feist, 2001.
A vitória politica de tais
movimentos extremados teve início na Itália, com a vitória de Mussolini em sua
marcha sobre Roma, tal política foi seguida mais tarde na Alemanha com a
chegada de Hitler ao poder. Para Hobsbawm a vitória do fascismo na Alemanha foi
o início de um movimento que se internacionalizaria, alcançando os quatro
cantos do globo.
MAZOWER, Mark. Continente Sombrio: A Europa no século XX. São Paulo: Companhia das Letras, tradução Hildegard Feist, 2001.
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